Velhos vizinhos

Lá na vizinhança é assim.

Cadeiras nas calçadas completam as tardes quentes com conversas sobre a vida de um e de outro. Qualquer um que passe com uma sacolinha do mercadinho ou da papelaria pára e diz, pelo menos, um oi.

Nas manhãs, velhinhos caminham, em casal ou em gangue. Os carros lá ainda são minoria e o caminho é quase sempre plano, o que facilita os exercícios para osteoporose e para alegria.

Famílias inteiras pedalam, enquanto outras pesseiam com seus cães nos finais de semana. A maior parte das casas conta com cachorros de raças grandes nos quintais.

No Carnaval, uma das ruas principais é fechada. As crianças vestem então suas fantasias e pulam ao ritmo de “foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros e depois morreu”. Um tapete de serpentina e confete.

Há quarenta anos, minha avó criava patos no quintal dos fundos. Há quinze, minha tia mantia um galinheiro. Hoje a dona Chiquita vende ovos frescos, a 4 reais a dúzia. Afinal, é no supermercado que as pessoas compram as aves – já prontas para o preparo.

Árvores frutíferas estão presentes na maior parte das casas. A Alzira, mulher do Paulo, nos presenteia com pencas de bananas, chuchus fresquinhos, abacates e mangas. Nós também fazemos nossa parte: na casa dela nunca falta acerola, nem carambola.

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pé de acerola no verão

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Diabetes

 

A vontade era de jujuba. Enfiei a mão no pote. Uma infinidade de pequenas balinhas laranjas rosas amarelas verdes roxas desfilou pelos meus dedos. Nenhuma delas me apetecia. Todas tinham a aparência ordinária, tão comuns em sua mesmice de cores infantis. O gosto, sempre o mesmo. Açucarado no começo, depois de algumas provocava enjôos. Foi então que vi uma, bem no fundo. Não acreditava em auras, mas o que seria então que chamava tanto a atenção naquela bala de goma? Tão distante, difícil de alcançar. Dia após dia, uma bocanhada nas outras jujubas deixava o caminho livre, isento de obstáculos. E assim, com o desenrolar das semanas, a rara balinha ficava mais ao alcance das mãos. Podia até sentir a superfície do almejado prêmio. Vez ou outra, os dedos roçavam-na de leve, em um carinho comedido, um leve toque de desejo. A trajetória até ela não seria fácil, mas também, o que me custaria tentar? No máximo, uma alta taxa de glicose no sangue. O que não mata engorda.