O Giovani se desvencilhou da mãe e veio falar comigo. A boquinha estava cheia de arroz e feijão preto.
“Tia”, ele começou, “o ônibus depois sobe, né?”. Foi uma pergunta inocente, mas curiosa, típica para os seus quatro ou cinco anos de idade.
A mãe então intimou o garoto. Enfiou a colher de plástico na quentinha aberta sobre seu colo e tascou a comida na boca da criança. Mastigou impaciente. Veio falar comigo de novo. Nós estávamos sentados na última fileira de bancos do ônibus, aquele lugar que está mais sujeito aos acidentes topográficos de São Paulo. Resultado: a cada anúncio de lombada, o almoço do menino diminuía um pouco. Grãos de arroz e de feijão jaziam no chão úmido do ônibus.
No trajeto que liga a Igreja Imaculda Conceição até o Pão de Açúcar da Brigadeiro Luís Antônio, Giovani almoçou e, de brinde, ganhou um gole do guaraná Schin que a mãe, contrariada, lhe ofereceu. Deram o sinal de parada. Exasperada, a mulher gritou com a criança, sob a garoa fina da hora do almoço.
“Vai, muleque, se enfia no mercado que tá chovendo!”
E Giovani, nos passos ligeiros de suas perninhas curtas, subtraiu-se no meio da multidão de guarda-chuvas.